- Alô? [...] Firmina. Firmina Ferreira. Estou ligando
novamente [...] Sim, entreguei nas mãos Dele para que cuide de tudo! Tem certeza que revelou? [...] Falou em
justiça?! Justiça ou Justina? Repita por favor. [...] Falou que estou pronta!?
[...] Sim eu sei, também me sinto assim. Eternamente grata!
Desligou o
telefone, bebeu o copo com água, e deixou a televisão ligada. Acordara
assombrada no alvor da madrugada e não conseguiu mais dormir. Mas agora não
estava mais aflita. Tomou banho, colocou um vestido de seda e rendas, depois o
casaco. Viu em seu celular 70 chamadas silenciosas e não atendidas naquelas
últimas horas. Percebeu que algo realmente fora revelado, ia retornar, mas não
estava com pressa para saber. Apagou as luzes e deixou o televisor falando sozinho
por garantia. Aquele seria o seu dia e já estava pronta para descer ao saguão
do hotel e tomar o café da manhã como vinha fazendo nos últimos nove
meses.
Tomou um gole quente do leite, leu o jornal e
engasgou-se com a torrada. O garçom lhe trouxe um copo de suco para aliviar a
garganta. Disse que não, preferia um champanhe da safra de 1943 e esperou
tossindo.
- Beba senhora, beba rápido!
- Ai, que alivio. Nossa...! Esse espumante é mesmo
bárbaro.
- Está melhor senhora?
- Claro que estou, na verdade nunca me senti tão bem.
Hoje vou celebrar meu aniversário, sabia?
- Aniversário?
- Gostaria de encerrar minha conta, enviem as
despesas para o meu advogado, por favor.
- Claro! Desejo-lhe parabéns?
- Não precisa, apenas avise na recepção para trazerem
meu carro. E diga também que estou deixando como sugestão que adquiram algumas
garrafas da safra de 1942. É sem dúvidas muito mais refinado.
Pegou um guardanapo e anotou os dizeres que seguiriam
nos convites para sua grande ocasião. “Firmina Justina Ferreira Dourado recebe
amigos para Jantar Formal em sua residência às 17 horas.”
Antes mesmo das oito horas estava em uma poltrona da
gráfica mais aristocrata da cidade. Escolheu o envelope mais elegante do
catálogo e pagou por 200 convites. Retirou uma lista de endereços da agenda e
pediu que os entregassem no mais tardar, até as dez da manhã.
- Lamento senhora, mas não aceitamos encomendas com
menos de 24 horas de antecedência. Deseja cancelar?
Retirou um volume suficiente de notas da carteira e
concluiu que também não antes das nove.
- Com certeza!
Cuidarei dos detalhes pessoalmente e começarei agora mesmo.
- Faça isso, meu jovem.
Aquela seria uma grande noite e por dentro, estava se
divertindo bastante com tudo isso. Fazia questão que lá estivessem todos
aqueles que riram da sua desgraça nas rodinhas sociais, e tinha certeza que
todos ansiariam para a ceia derradeira com a viúva titular da fortuna de
Ferreira Dourado. Planejaria, mesmo em cima da hora, não queria que a data
passasse despercebida e faria daquela a ocasião oportuna e ideal para anunciar
seus planos quanto ao destino das empresas do marido.
Havia quase nove meses que os dois estavam morando
separados e a menos de dois convocaram a justiça para dar início ao que seriam
longos anos de um litígio conturbado, mas não chegaram a assinar o desquite.
Antonio vinha dificultando e faltando tanto com processo que era insuficiente
para contestar a posse de Firmina sobre o patrimônio do falecido. Ainda
tentavam marcar a primeira audiência de conciliação, e a única pessoa que
poderia disputar a bolada herdada seria o filho do primeiro casamento de
Ferreira, justo quem estava dirigindo o automóvel na madrugada que, pai e filho
capotaram e faleceram na BR 116 estampando todos os jornais da cidade.
Se Deus quis assim não iria mesmo questionar as
razões.
- Posso lhe acompanhar até o carro, senhora? –
sugeriu o vendedor.
- Por favor.
Sabia que não
era de bom tom marcar reuniões nas segundas feiras, dia em que as butiques da
alta classe fechavam as portas para balanço e os salões de beleza acompanhavam
o mesmo recesso. Qualquer dama teria dificuldades para se apresentar adequada a
um jantar de fino porte, salvo enterros e velórios, até porque não era bom tom
esbanjar glamour ou destacar-se mais que a própria família desolada. Justamente
por essas razões, não se importou em fazer sua grande noite na própria segunda,
como lhes disse, estava de muito bom humor naquele dia.
Além disso, queria confundi-los e causar desconforto.
Estava "sambando" em cima da sua nova posição e não se sentia mal por
nada. Até porque não fizera nada, acreditou fielmente que foi abençoada por
Deus e só. Não desejou a morte deles, mas algumas vezes sim, quando vivia o
pico da mágoa. Ultimamente estava com tantas dificuldades financeiras e sociais
que só pensava em
justiça. Resolver tudo com justiça e na justiça, mas pouco
foi preciso.
Antonio sujara
seu nome de forma vulgar, difamou-a na frente de todos os amigos da família e
ainda a fez passar por ridícula. Não gostava nem de lembrar, nunca havia sido
tão humilhada e reduzida. Sabia que ele escondia muitas aventuras e amantes
antes de procurá-lo na cama, porém sempre fora fiel ao marido. E a Deus, os
dois grandes valores que sua mãe lhe ensinou quando moça. Ela a aconselhava com
as virtudes necessárias para ser uma esposa da sua classe e status.
- Sinto-me tão
radiante quanto no dia do meu casamento.
- E está muito bonita, senhora, se me permite
dizer.
- Irei finalmente comemorar meus 52 anos e torcer
para que me venham pelo menos outros cinquenta. Quero viver a partir de agora,
valorizar cada dia. Não acreditava quando me diziam que a vida podia acabar a
qualquer instante – parou séria e abriu a porta do carro. Pareceu realmente se
dar conta do que falou. Levou um choque – Como é mesmo seu nome rapaz?
- Cristiano, senhora.
- Muito bonitos esses seus óculos de sol. Posso
experimentar?
- Claro.
- Mas como eu dizia... Pode mesmo, Cristiano.
Acredite, a morte chega de surpresa. É um perigo!
- Sim é verdade, eu sei Sra. Ferreira Dourado. Eu
fiquei sabendo...
- Irei andando mesmo – fechou a porta do sedan e
sorriu maliciosa - minha residência é muito perto. Estava tomando café em um
hotel, mas como irei para casa hoje... Não se importa se eu deixar o carro
aqui?
- Fique à vontade.
- Posso ficar com os óculos? Apreciei-os
bastante.
- Sim, não estão a sua altura, mas aceite como meu
presente.
- De repente me deu medo de entrar nesse carro,
acredita? Li no jornal a sinopse de um filme de terror que comecei a assistir
ontem na televisão e ainda devo estar impressionada... Não consegui dormir até
– e começou a rir de forma exagerada e desgovernada.
-Imagino senhora, posso imaginar... – o rapaz ficou
bastante constrangido com a situação. Não sabia se ria para agradar a cliente,
se lamentava a tragédia que era a vida, ou se esperava que agradecesse os
óculos. Preferiu garantir a gorjeta extra e fazer jus às normas da empresa, a
primordial era clara: não contrariar os fregueses.
Só uma coisa cabia ser dita naquela situação.
- Com licença, senhora. Irei providenciar os
convites.
- Até logo, meu jovem. Até logo. – riu num misto de
desespero e alegria.
No fundo estava bastante impressionada com o poder de
Deus e o do próprio ser humano. E até um pouco assustada com o tal filme
mesmo... Uma coisa se uniu a outra e resultou numa crise nervosa. Não conseguia
parar de rir e pelas ruas todos pareciam notar horrorizados. Era socialite
célebre em Fortaleza, todos conheciam seu marido. Virara favorita das colunas
sociais que constantemente publicaram notas comentado sua crise conjugal ou
especulando uma reconciliação.
Chegou, respirou fundo e abriu as portas da casa com
gosto e de uma vez, as criadas se assustaram e cantarolou um afinado e agudo
bom dia.
- Cruz credo, dona Justina. A senhora me mata de
susto assim.
- Estava assistindo a sessão da noite ontem também,
Gloria? Um horror aquele filme.
- Que bom que chegou, não sabia o que fazer. Quer ver
os recados?
- Acabei de chegar, estou morta! Vim andado –
esparramou-se no sofá e prendeu o cabelo – Ligue a central de ar e me traga um
copo de suco, estou soluçando. Olha, os olhos cheios d’água. Nossa!
A governanta
fez sinal para outra criada trazer a bebida e ligar o ar refrigerado. Foi
apanhar o bloco de recados na outra sala, esperou que a patroa parasse o
singulto e entregou-lhe.
- Está aqui, senhora.
- Muitos recados, Glória?
- Bastantes, dona Justina.
Folheou o caderno e esboçou ar de desinteresse. Foi
direto ao assunto:
- A cerimônia será aqui mesmo. Prepare minha melhor
louça, a mesma que usei naquele aniversário. Quero mesas no jardim e o jantar
prepare para 200 convidados. Ligue as fontes e acenda todas as luzes às 17
horas. Acenda todas mesmo, quero muitas luzes. A propósito, desligue o ar e
abra todas as janelas.
- E o que vamos servir?
- O mesmo jantar do meu aniversário. Quero dar
motivos para minhas amigas terem muito que conversar depois - disse sorrindo -
E o mesmo vestido!
- O mesmo vestido?
- Sim! O vestido e os sapatos.
- Mas senhora, penso que...
- Não me questione, Glória! Obedeça apenas. Desligue
o telefone, não quero que liguem confirmando a festa.
- Farei.
- Outra coisa: muitas flores. Flores vermelhas, finas
e delicadas. Sabe como gosto delas: bem encarnadas!
- Aproveito alguma dessas?
- Claro que não, estas estão horríveis... Flores de
defunto! Não quero coroas, parecem secas e ásperas, mude todas. Quero muitas! –
se recompôs e levantou do sofá. Pegou a bolsa.
- Chamo o motorista?
- Sim, mas não
irei sair, vou para o meu quarto. Tenho muitas coisas para resolver, mas farei
pelo celular. Peça apenas para apanhar meu carro na gráfica.
Abraçou Glória e falou:
- Hoje quero apenas poder celebrar meus 52 anos e
nada mais. Sou uma mulher rica e estou viva. Glória. Viva! É fui abençoada
também, sabia? – a empregada esforçou-se e sorriu sem graça – Vou para banheira
relaxar um pouco. Não me incomode, apenas quando meu advogado chegar com o
representante do cartório. Leve-os para a biblioteca e me chame.
- Deseja algo mais?
- O bolo, oh Glória! Ainda tenho que ligar para
trazerem meu bolo para cá – e foi para o quarto cantarolando uma valsa
fúnebre.
Sentia-se vivendo um "déjà vu" ou estava
idealizando vivê-lo. Um traço preciso que marcava a personalidade de Firmina
Justino era o rancor. Dificilmente perdoava ou esquecia uma mágoa. E a noite do
seu último aniversário a marcara profundamente.
Começou chegando atrasada à própria festa e isso
desencadeou uma séria de outros acontecimentos.
Primeiro, o marido já estava bêbado e começou a enchê-la
de perguntas sobre onde esteve. Partiu como uma grande brincadeira, mas a
conversa foi ficando séria e rapidamente desencadeou uma discussão. Dissera que
o salão estava muito cheio e demorara a aprontar-se. Então, o filho de Antonio
Ferreira, que nunca lhe elogiara uma unha, estranhou e questionou seu cabelo e
maquiagem. O marido quis o nome do salão, dissera um... Uma amiga comentou que
estivera lá e não a vira. Ele se aborreceu e foi para o quarto colocar o mesmo
vestido que usaria naquela noite.
Quando desceu
as escadas estava tão linda e deslumbrante que inflamou uma crise de ciúmes.
Ele a acusara de traição na frente de todos e chamou o motorista, perguntou em
alto tom aonde levara sua mulher.
- Ao Conjunto Dois Irmãos, doutor.
- Conjunto Dois Irmãos? Está me traindo com um
pobretão, cretina?
- Não acredito que está fazendo isso, Ferreira.
- Responda!
- Sou mulher de princípios. Respeite-me!
- Então porque estava mentindo? O que fazia lá?
- Conversamos depois, não é momento para isso.
Estamos recebendo convidados!
Ele a puxou pelo braço com força e lhe rebocou o
corpo com firmeza.
- Responda! Responda agora!
Falou em tom tão agressivo e intimidador que o
motorista estremeceu pela patroa e tomou a palavra.
- Na Igreja Jesus Aleluia Irmão, doutor.
- Como?! Está virando crente, Justina? Era isso que
estava escondendo?
E começou a rir. Foi uma comoção geral, todos riram
juntos. Ficara bastante embaraçada e não conseguira responder. Saira de casa
aos prantos e fora para um hotel e não voltara. Fora o inicio da
separação.
Firmina era católica praticante de uma vida inteira e
criada por família de fortes princípios ortodoxos, diversas vezes criticara
outras religiões em suas conversas paralelas. Piadas preconceituosas, adjetivos
desnecessários... Por isso ficara tão envergonhada de dizer na frente de todos
onde estivera.
Na noite anterior ao tal aniversário sentiu-se tocada
pelas mensagens da doutrina na programação da televisão e quis ver de perto.
Escolhera uma igreja distante para que ninguém a visse por lá, e quando lá
chegou, orou com fervor. Aquela foi a primeira e a última vez. Pensou em
voltar, mas não teve coragem depois da humilhação.
- Senhora? Seu advogado já está na biblioteca com o
representante do cartório. Vai descer agora?
- Sim, estou indo.
Colocou um roupão e atravessou a casa, ansiosa.
- Bom dia, senhores. Não, não precisam se levantar,
fiquem sentados mesmo, serei breve por hoje, mas quero deixar tudo encaminhado
com o cartório. Depois o senhor, Dr. Rubens, cuidará dos pormenores para
mim.
- Bom dia, Sra. Ferreira. Cuidarei do que for
preciso. Vejo que está muito bem e disposta hoje. Recebi o recado de minha
secretária e lhe trouxe o representante do cartório, mas liguei a madrugada
inteira para lhe dar a noticia...
- Estava com Deus na outra linha! Agora, estou pronta
para dar os rumos dos negócios!
- Não acha
muito cedo? Já sabe o que pretende fazer?
- Absolutamente, desfazer-me de tudo!
- Está certa disso?
- Sim. E já quero deixar tudo assinado.
Foram horas de conversas e acertos, assinou
documentos, procurações, negociou títulos, imóveis... Iria conservar apenas
aquela casa, seu automóvel e algumas poucas ações. Não teria arrependimentos.
Nunca aspirou a uma mínima vocação para o mundo empresarial. Terminaram e se
dirigiram a saída.
- Bonita a decoração – comentou o advogado – será uma
noite bem glamourosa pelo visto.
- Obrigada. Sou mulher de bom gosto e muito abençoada
por Deus. Sempre fui, e quero celebrar minhas bênçãos sem culpas. As viúvas
costumam entrar em quarentena pelos seus maridos, eu sei, mas não entrei.
Talvez um dia faça isso, mas só se for por outro. – rindo - Antonio não. Não
merecera o presente que fui em sua vida. Virá mais tarde?
- Claro, venho prestar homenagens.
- Senhora! Chegou! – interrompeu a criada.
- Senhores, preciso receber o meu bendito bolo. Glória
acompanhe os cavalheiros até a porta enquanto recebo a encomenda. Depois leve o
meu vestido para o quarto e me aguarde lá.
Encaminhou-se ate às portas do fundo e assinou a guia
de recebimento.
- Coloque-os próximo à mesa de frios.
Passou pela cozinha, conferiu o cardápio, as bebidas
e as roupas dos empregados. Subiu para o quarto onde a governanta a
aguardava.
- Agora irei me arrumar, Glória. Os convidados breve
começarão a chegar, receba-os com sorriso no rosto, sim? Quero muita alegria e
animação. O jantar deve ser servido às 18h em ponto para que tenham uma
indigestão quando me virem. Verifique as luzes.
- A senhora não me passou a lista de convidados.
- Não, não precisa. Deixe as porta aberta para quem
desejar entrar.
Quase todos os
amigos que ali estariam eram empregados ou tinham negócios ligados às empresas
Ferreira Dourado. O advogado aconselhou que fosse delicada quando falasse sobre
o assunto. Estava despreocupada quanto a isso e esperava, francamente,
compartilhar tudo com aqueles bajuladores de cargos e promoções.
Às 18 horas e 30min apareceu deslumbrante no alto da
escada usando o vestido vermelho que comprara em Londres exclusivamente para
seu aniversário de 52 anos. Mas para aquela ocasião acrescentou um colar de
diamantes com ouro branco e um anel solitário de uma esmeralda turco-grega
lapidada por escravos feudais. Tinha consciência que ficara absolutamente muito
mais encantadora do que no desastroso natalício. E claro, estava com o ego bem
mais aguçado.
Todos paralisaram as expressões e focaram-na a
atenção. Soltou os cabelos e completou o visual com os óculos escuros do
vendedor da gráfica.
- Boa noite a todos! Agradeço a presença, apesar das
despeitas, me sinto renovada e estou passando agora uma borracha em suas
consciências.
Começou a descer as escadas com a leveza de quem
levita, reproduzindo-se em uma película preto e branco. Destacava-se apenas ela
e suas rosas vermelhas espalhadas pelos salões.
- Mas como
esta é a minha uma grande noite, deixarei o passado para trás e vou falar do
futuro e de negócios. Fiz uma generosa retribuição a um presente que recebi de
Deus. Quis agradecer minha graça, pois nessa madrugada fui abençoada durante um
culto televisivo e quando para lá liguei, Ele, Deus, revelou-me que estava
pronta para aceitá-lo em minha vida. Desci para o café e deparei-me com a
sinopse de um trágico filme no jornal, e os convidei para que acompanhassem de
perto o triste fim de Antônio. – levou a mão à boca e sorriu viúva, o verde do
anel espelhou em seus olhos - Fiz novos planos para minha vida e já estou
pronta para começá-los. Doei todas as empresas e ações que herdei para aquela
igrejinha suburbana que ouviram falar em meu aniversário de 52 anos. A Igreja
Jesus Aleluia Irmão. Ela administrará a partir de agora seus empregos.
A plateia murmurou eufóricas reações e ela parou,
olhou-os demoradamente passeando a vista por todos que lá estavam. Retomou a
cena.
- Glória, me traga aquela garrafa de champanhe 1942
que Antonio ganhou e guardou para uma conjuntura especial. Era para aquele dia,
mas agora poderei finalmente comemorar meus 52 anos – recebeu a taça e a
garrafa. Entregou para um diretor executivo da confiança de Ferreira Dourado –
Faça o favor.
Ele abriu e o estouro soou e refletiu não apenas nos
olhos de Justina. Estendeu a taça para que ele a servisse.
- Estou pronta para ser líder religiosa desta cidade
e vocês agora compõem o coro para minhas cortinas. E como primeiro manifesto de
minha autoria irei celebrar os cantos religiosos e fúnebres da noite. Amém? –
Estendeu a taça convocando o brinde.
E o coro morto e desenganado não completou.
- Eu disse amém!
- Amém...- responderam.
Bebeu
seu espumante 1942 e sorriu como uma lady para seus súditos. Engasgou-se e
começou a tossir. Todos ficaram assistindo sem completar uma ação. Começou a
faltar-lhe o ar e fez sinal para que batessem em suas costas. Eles engoliram o
ar da sala e conspiraram com o olhar. Ela caiu morta ao chão. E a noite seguiu
e o velório também, mas agora eles tinham os três corpos ao lado da mesa de
frios.